Segunda-feira, 6 de Outubro de 2008
“AQUELE QUERIDO MÊS DE AGOSTO”


Gostei imenso do filme português
Aquele Querido Mês de Agosto de Miguel Gomes. O realizador concebeu um híbrido hilariante entre o documentário e a ficção com cenas bastante bem conseguidas. Há momentos verdadeiramente engraçados e que muito apontam para um olhar crítico sobre a nossa mentalidade lusitana. A deambulação da rapariga à procura de um
casting entre os jogadores da malha… jogadores estes que fazem parte da equipa de realização do próprio filme e que a estão constantemente a remeter para outra pessoa: “olhe, fale ali com aquele senhor”, “olhe, pergunte ali àquela senhora que talvez ela a possa esclarecer”… frases destas que fomentam um impulso constante para a burocracia e geram um andar à deriva sempre a falar com quem nada sabe do assunto. Esta situação lembrou-me automaticamente as repartições públicas nacionais mas também as universidades, os hospitais, os bancos e tantos sítios que procuramos à procura de informação clara e directa. Impossível.
Depois, os adjectivos constantes: “este rapaz é um génio da guitarra!”, “o Fábio [depois Hélder] é muito isto e muito aquilo”, tudo em superlativos recheados por aquele gosto pela mediania e, diria talvez Henrique Garcia Pereira, que tive recentemente o prazer de ouvir no lançamento do seu último livro,
Fragmentos do Mediterrâneo, Uma análise Multidimensional, O Rendilhado Oriental, por um total desprezo pelo trabalho bem feito. O filme leva-nos até às festas “pimba”, comuns durante o mês de Agosto nas aldeias e vilas nacionais que recebem os emigrantes, em concelhos da região centro de Portugal: Arganil, Pampilhosa da Serra, Tábua, entre outros, e conta com a colaboração das pessoas desses lugares no papel de personagens da “história” e da acção
docuficcional.


As personagens compõem uma manta de retalhos narrativa que vai posteriormente fazer sentido na cabeça do espectador. O Paulo, um desnorteado trabalhador rural que acumula cicatrizes no corpo maltratado pelas bebedeiras recorrentes, mistura-se com a história de um outro personagem que mata a mulher à machadada, tudo isto associado a excertos narrativos que nos remetem para as dificuldades que a equipa de produção do filme encontra para realizar o mesmo. A história do Paulo, mas também o evento da machada, ambos relatados por um casal de idosos e não só, cruzam-se com a hérnia discal tratada por milagre na procissão, com os bailaricos ao som de música “pimba” e com o casal de adolescentes apaixonados. Tudo numa textura cruzada em que o espectador é confrontado com a experiência da equipa de realização, com a experiência das pessoas do local na sua participação no filme e com a ficção criada para unir todas estas peças numa narrativa estimulante.
A conversa dos dois residentes da aldeia recentemente confrontados com os seus papéis como actores do filme é bastante hilariante. Neste diálogo, um especialista na colocação de janelas e um gestor de condóminos reflectem sobre as dificuldades que encontram para memorizar as “deixas” e gerir o
stress associado ao filme. De morrer a rir. Muitos outros momentos poderia referir mas conto, em tão poucas linhas, alertar-vos para a obrigatoriedade de verem este filme que me recordou o cinema brasileiro na sua capacidade de contar uma história sem actores profissionais. Recordou-me o belo segundo filme de Eliane Caffé,
Narradores de Javé.
Aquele Querido Mês de Agosto é imperdível.
De
mouseland a 22 de Outubro de 2008 às 19:46
:mrgreen::mrgreen::mrgreen: Olá Margarida,
Ainda bem que apreciaste o filme. Os genéricos são cómicos, muito boa aquela discussão final sobre as sonoridades do local. xxx mouse
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